domingo, agosto 20, 2006

Rennes-le-Château

No primeiro dia de Julho de 1885 uma pequena aldeia no sul de França recebeu um novo pároco. Essa aldeia, situada na região do Languedoc, logo acima dos Pirinéus, chama-se Rennes-le-Château. O novo pároco, François-Bérenger Saunière era nessa altura jovem, com 33 anos, e aparentemente desadequado para uma paróquia tão despovoada e inerte como esta Pode-se observar um mapa desta região do sul de França para se localizar Rennes-le-Château. A aldeia fica no topo da serra, a quarenta quilómetros da cidade medieval de Carcassonne.

Tendo concluído o seminário, foi ainda padre em Alet e Le Clat antes de ser mandado para Rennes-le-Château. Naquela altura haveria 298 pessoas na aldeia e aparentemente era um local de exílio para uma pessoa da sua idade, que possivelmente ambicionava uma vida mais cosmopolita e mas activa. Havia contudo o conforto de estar perto da sua aldeia natal, Montazels, e portanto não se sentiria tão isolado. Além disso, a mudança era uma melhoria na sua condição, pois no seu cargo anterior, em Le Clat, estivera em pior situação: isolado não só geograficamente mas também culturalmente, pois a aldeia dedicava-se na totalidade à criação do carneiro. Rennes-le-Château, pelo contrário, era uma aldeia com um passado importante.
Pouco tempo após a sua chegada, a 4 de Outubro de 1885, antes das eleições, Saunière proclamou um discurso fortemente monárquico, o que desagradou a hierarquia eclesiástica, que lhe retirou o salário. Devido à sua forte atitude anti-republicana, foi mandado pelo bispo de Carcassonne como professor para o seminário de Narbonne, de 1 de Dezembro de 1885 a Julho de 1886. Quando regressou, teve que viver durante uns tempos da bondade dos habitantes da aldeia, e porque não podia habitar no presbitério devido ao seu estado de degradação teve que alugar um quarto a uma arrendatária de nome Alexandrine Dénarnaud. Uma vez obtido o perdão dos seus superiores, Saunière recuperou o seu salário, e entre 1885 e 1891 terá recebido perto de 900 francos por ano, que não dando para fazer fortuna era com certeza superior ao que seria de esperar do salário de um pároco rural em finais do século XIX. Tendo em consideração que ele muito possivelmente beneficiaria de ajudas e contribuições dos habitantes da aldeia, deveria viver sem grandes preocupações. Nestes primeiros tempos empregou como criada e governanta uma rapariga nova, Marie Dénarnaud, que era filha da sua arrendatária Alexandrine Dénarnaud.

Bérenger Saunière Marie Dénarnaud
Bérenger Saunière (1852-1917) Marie Dénarnaud (1868-1953)

Perto de Rennes-le-Château estava a paróquia de Rennes-les-Bains, da qual era padre Henri Boudet. Saunière e Boudet viriam a ser grandes amigos, e visitavam-se com frequência. Pouco depois da sua chegada à aldeia, Saunière interessou-se pela ideia de restaurar a igreja da paróquia, consagrada a Sta. Maria Madalena em 1059. Este edifício remontava ao tempo dos Carolíngios (século VIII ou IX), e fora construída sobre as fundações de uma estrutura visigótica ainda mais antiga, datada do séc. VI. É fácil imaginar o estado em que estaria esta igreja e também se compreende a urgência que Saunière teria em recuperá-la. Boudet poderá ter encorajado Saunière a iniciar a restauro do edifício em 1891, estimando-se o investimento necessário para as reparações urgentes na casa dos 2800 francos em moeda da altura. Diz-se que Boudet não só encorajou como também financiou a reconstrução da igreja. Talvez seja mais provável que Boudet tenha ajudado a arranjar patrocinadores para a reconstrução.
Em 1886, ainda sem salário, Saunière começou a tarefa de reconstrução, investindo ele próprio 518 francos que somou a fundos municipais. Não se sabe qual a origem dessa quantia, tendo Saunière admitido que a tinha retirado de uma dádiva da condessa de Chambord, a mulher austríaca de Henri, conde de Chambord, pretendente ao trono de França pelo ramo Bourbon. O conde de Chambord era neto do rei Carlos X (irmão de Luís XVI, que foi decapitado durante a Revolução Francesa em 1793). Saunière já se havia demonstrado politicamente a favor dos Bourbons quando discursou a 4 de Outubro de 1885, fazendo talvez sentido que ele afirmasse ser a condessa de Chambord a benfeitora. Esta dádiva figura em cartas justificativas que Saunière apresentaria muitos anos mais tarde a uma Comissão de Inquérito encarregada de tirar a limpo a sua contabilidade. Não há provas concretas desta doação e não se entende à partida por que razão estaria a condessa interessada em patrocinar a obra do padre. Outra versão mais convincente estabelece que o padre anterior a Saunière na paróquia de Rennes-le-Château tinha guardado um pequeno depósito monetário proveniente de uma doação de uma paroquiana. Saunière poderá ter usado este dinheiro, que não foi gasto pelo seu antecessor.